A
cobertura da Televisão Pública de Angola
(TPA) à decisão do Tribunal Supremo de impugnar a nomeação de Suzana Inglês
para o cargo de presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), na quinta,
feira, 17, é preocupante. A TPA
manifestou claro favorecimento editorial ao MPLA, como é aliás prática
recorrente. A três meses da realização das eleições, o MPLA continua a
monopolizar o tempo de antena da televisão pública e já está em pré-campanha.
Após
a leitura da notícia sobre a decisão judicial, um dos apresentadores do
telejornal leu um extenso comunicado do MPLA a respeito e, logo de imediato, a
estação televisiva ouviu dois juristas, nomeadamente Inglês Pinto,
ex-bastonário da Ordem dos Advogados de Angola (OAA) e Raúl Araújo, professor
universitário e colega da Suzana Inglês na CNE.
Ambos
tergiversaram sobre a deliberação do Tribunal Supremo mas, de forma grosseira,
a TPA manipulou as vagas declarações dos juristas colocando uma legenda
temática durante o noticiário anunciando que “juristas rebatem decisão do
Supremo”.
De
acordo com os dicionários de língua portuguesa, “rebatem” significa, entre
outros, desmentem, impugnam, repelem, destroem, reprimem e refreiam. Em
circunstância nenhuma, porém, os dois entrevistados da TPA contestaram a
decisão do Tribunal Supremo. Na verdade, os juristas não manifestaram qualquer
posição sobre a legalidade ou justeza da decisão, limitando-se apenas a
reiteirar que, em democracia, as diferenças são resolvidas com recurso aos
tribunais, para além de usarem a decisão como evidência do triunfo do Estado de
direito e democrático angolano. Também o MPLA aproveitou a oportunidade para,
de forma propagandística, afirmar a existência de separação efectiva de poderes
em Angola.
Em
momento algum a TPA procurou ouvir a UNITA ou o PRS que interpuseram os
recursos para a impugnação da nomeação de Suzana Inglês.
Raúl
Araújo aproveitou a ocasião para meter a foice em seara alheia ao ter afirmado,
nas suas conclusões, que “é que assim que se resolvem questões do género e não
com manifestações, embora estas ajudem”. O constitucionalista referia-se à
manifestação convocada pela UNITA, para o dia 19 de Maio.
Como
jurista, Raúl Araújo sabe muito bem que o direito à manifestação está
consagrado na Constituição e é um mecanismo legítimo de recurso dos cidadãos
para fazer valer os seus direitos e
protestar num Estado de direito e democrático. A apresentadora Ana Lemos
retomou as palavras do jurista para encerrar o telejornal distorcendo-as de forma perigosa ao falar em “manifestações
violentas”.
Foi
a TPA que, a 12 de Março passado, legitimou os actos de violência perpetrados
por milícias pró-governamentais contra cidadãos indefesos a 9 e 10 de Março.
Essas milícias, inclusive, atacaram a residência do rapper Carbono Casimiro,
onde este se encontrava reunido com mais quatro organizadores para a
planificação de uma manifestação no dia seguinte, 10 de Março. Atacaram-nos com
barras de ferro, causando ferimentos a quatro deles. A TPA concedeu destaque e tempo de antena ao
suposto Grupo de Cidadãos Angolanos pela Paz, Segurança e Democracia na
República de Angola que reivindicou os ataques. O grupo prometeu mais actos de
violência contra manifestantes e opositores, argumentando que assim agia em
defesa da “paz, segurança e democracia
em Angola.” A TPA ocultou a identidade e o rosto do porta-voz dos atacantes e
não concedeu qualquer espaço de antena às vítimas.
Com
a cobertura da impugnação de Suzana Inglês, a TPA demonstrou, uma vez mais, ser
um veículo de propaganda política dos poderes instituídos.
Fonte:makaangola.org
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