quinta-feira, 31 de maio de 2012

Angola é má para a SADC - diz analista.


O Fórum Regional para o Desenvolvimento Universitário (FORDU) concluiu que Angola representa uma ameaça para a SADC – a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral. A conclusão saiu de um encontro organizado por aquele Fórum na Faculdade de Direito do Huambo.

Ângelo Kapwatcha, presidente do Fórum, disse que a corrupção e impunidade são aceites como algo normal e institucionalizado, o que fragiliza todas as instituições angolanas.

“Camponeses e doutores de outros países dizem que Angola é que mais complica a integração na SADC, disse o activista alegando que “é um país corrupto, é um país onde a democracia não anda, não respeita os seus cidadãos.”

Considera ainda que a integração regional numa pluralidade de ordenamento jurídicos heterogenia deve partir da compreensão comunitária do espaço.

Segundo Kapwatcha, a lei constitucional angolana não tem característica do direito comunitário, mas do direito internacional, dificultando a integração de Angola na SADC. Alega que o direito internacional baseia-se no interesse ao passo que o direito comunitário no espirito de interajuda.

“Em nenhum momento Angola fala da SADC na sua constituição. Primeiro Angola fala que só aceita a política internacional quando respeita a soberania interna isso significa que é o próprio interesse. Depois afirma que temos de ter o respeito e não ingerência nos assuntos internos. O primeiro pressuposto do direito comunitário é a ingerência.”

O debate com os estudantes da faculdade de direito do Huambo debruçou-se sobre o tema “integração regional na SADC realidade ou utopia”  e  apontou também a  falta de uma política de segurança, a limitação dos espaços da cidadania em Angola, como importantes obstáculos para inserção  deste país  na Comunidade para o Desenvolvimento da Africa Austral.


Fonte: VOA

Bispo do Namibe apela ao "voto pela pátria".


Os eleitores cristãos devem votar  pelos interesses “da pátria” e não dos partidos políticos, disse o Bispo do Namibe Dom Dionísio Hisilenapo.

“Não os partidos políticos que contam nas eleições, é a pátria,” disse o bispo para quem se deve votar  “em função dos interesses da pátria”.

O bispo disse ainda que os eleitores não devem recorrer à violência encarando a votação como um acto normal que não requer  um estado de espírito excitado.

“Não vale a pena fazer subir a tensão arterial, nem fazer uso da violência, nem agressividade porque as eleições é um acto normal em todos os países,” disse.

“O anormal seria se não houvesse eleições,” acrescentou.

Os cristãos não devem comporta-se como se comportam os militantes de partidos políticos que se “arrastam á reboque de bandeiras partidárias, deixando para trás o patriotismo, um dos elementos que enobrece a alma angolana”.

O Bispo do Namibe garantiu que em Angola, apesar das vicissitudes de vária ordem, ainda assim, existem homens e mulheres patriotas, aqueles que se entregam de corpo e alma a causa da justiça social.

Fonte.VOA

Tribunal Constitucional Fixa datas fora da lei.


Lisboa  – O Presidente do Tribunal Constitucional Rui Ferreira, é citado em meios políticos e acadêmicos em Luanda como tendo usurpado as competências da Assembleia Nacional por estabelecer, ele próprio, um prazo para a apresentação de candidaturas às eleições diferente daquele fixado pelos artigos 37º e 40º da Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais.


O número 1 do Artigo 37º da lei 36/11, de 21 de Dezembro, estabelece o seguinte: “As candidaturas a Presidente e a Vice-Presidente da República são apresentadas até ao vigésimo dia após a convocação das eleições gerais”.


O número 1 do Artigo 40º da lei 36/11, de 21 de Dezembro, estabelece o seguinte: “As candidaturas a Deputado à Assembléia Nacional. são apresentadas até ao vigésimo dia após a convocação das eleições gerais”.


Tendo as eleições sido convocadas no dia 24 de Maio por Decreto Presidencial, feitas as contas, o vigésimo dia após a convocação das eleições gerais é o dia 13 de Junho.  De acordo com os acadêmicos, a  lei não confere ao Tribunal Constitucional competência para fixar uma outra data.


Ao fixar o dia 31 de Maio como sendo o dia para o início da apresentação das candidaturas e o dia 19 de Junho como sendo o último dia, as candidaturas não serão apresentadas até ao 20º dia após a convocação das eleições gerais, mas sim até ao 26º dia após a convocação das eleições.


“Se o Tribunal Constitucional também viola a lei eleitoral, então este processo eleitoral está mesmo mal”, concluem os analistas.

Fonte: Fonte: Club-k.net




quarta-feira, 30 de maio de 2012

Álvaro da Silva Kamulingue Membro do MPU está desaparecido.

Luanda - Desde domingo último que está desaparecido Álvaro da Silva Kamulingue. Trata-se dum dos coordenadores duma Associação denominada Movimento Patriótico Unido que no passado dia 27 (domingo) anunciou sair a rua, para entre outras causas exprimir descontentamentos pela situação social e reclamar direitos de desmobilização, devidos pelo governo.

O desaparecido ter-se-ia refugiado no hotel Skyna

Kamulingue, segundo relataram companheiros, terá sido raptado por homens á civil nas imediações do largo Sagrada Família, depois que foi dispersada do largo do BNA e imediações do Baleizão, na baixa de Luanda pelas forças policiais e para-militares a concentração de manifestantes.


O desaparecido ter-se-ia refugiado no hotel Skyna, de onde ainda foi capaz de falar aos outros por telefone.


Enquanto permaneceu na unidade hoteleira, contactamo-lo por telefone, local de onde descreveu as circunstâncias do cerco a que se via sujeito. Segundo Isaías Kassule, um outro responsável do movimento por nós abordado nesta terça-feira, o telefone ficou desligado pouco depois dele ter cruzado a zona do largo da Sagrada Família.


“Já recorremos a polícia na baixa de Luanda, dirigimo-nos depois ao comando provincial. Tudo que nos disseram é que não há rastos do nosso companheiro o que nos deixa preocupados”.


Se até quinta-feira não for liberto o nosso companheiro, vamos convocar novas manifestações, disse.


No que pode ser interpretado como tentativa de enfraquecimento do movimento, os antigos militares da UGP, unidade de guarda presidencial, que se declararam tomarem parte da pretendida manifestação no palácio presidencial, foram convocados para um encontro na quinta-feira com os responsáveis da Casa-Militar, supostamente realizado no estádio 11 de Novembro.


Segundo relatos dos participantes, um dos pontos de acordo foi que os ex-militares provassem através de documentos, terem pertencido aquela unidade militar, condição de usufruto dos direitos a que têm reclamado.


Nos últimos tempos, Luanda ficou tomada pela paranóia de repressão contra quem se quer manifestar e não raras vezes a cobertura mediática custa socos dos “kaenches”que integram forças paralelas de segurança!


No domingo 27, era visível a presença de efectivos uniformizados da polícia, em pontos como o conhecido largo Serpa Pinto e a praça da Independência.



David Mendes: "Apesar de todas as ameaças terminou a época do medo".


A Comissão de Direitos Humanos da União Africana exortou o governo angolano a tomar medidas para evitar qualquer ataque a David Mendes, advogado e líder do Partido Popular (na foto: à direita).

O apelo foi feito numa carta da Comissão dos Direitos Humanos datada de 30 de abril, que se baseia numa queixa encaminhada à União Africana pela organização não-governamental de defesa dos direitos humanos "Centre for Human Rights", com sede na África do Sul. A queixa da ONG chama a atenção para o facto de o governo angolano cometer violações de direitos humanos contra David Mendes, em particular, desde que Mendes apresentou uma queixa criminal à Promotoria Geral do Estado de Angola, acusando o presidente angolano de corrupção e de desvio de fundos.

A DW África conversou hoje (29.05.2012) com David Mendes e perguntou se ele espera que o governo de José Eduardo dos Santos vai acatar o pedido da Comissão de Direitos Humanos da União Africana.
David Mendes (DM): Eu acredito que o Presidente da República José Eduardo dos Santos não queira mais ver o seu nome envolvido em crimes e acredito que a internacionalização do meu caso torna visível qualquer ação que se possa cometer contra mim.
DW África: Tem conhecimento de alguma reação do governo angolano a esta carta da Comissão de Direitos Humanos da União Africana?
DM: Eu acho que o governo angolano não vai responder a essa carta. Vai-se manter no silêncio. Só espero que o Provedor da Justiça e o secretário de Estado dos Direitos Humanos encarem esta situação com muita preocupação. Em dois processos crime nós requeremos às autoridades que se esforcem por proteger determinadas pessoas e passado um tempo algumas dessas pessoas foram mortas. A União Africana, com essa carta, com essa recomendação, pode chamar a atenção o regime do Presidente José Eduardo dos Santos, contribuindo assim para que eles encararem com mais responsabilidade a proteção do meu património e sobretudo da minha própria vida.

DW África: Acha que a sua vida está ameaçada em Angola?

José Eduardo dos Santos, presidente angolano, (na foto), foi acusado por David Mendes de desvio de dinheiros públicos para as suas contas pessoais
DM: Todas as pessoas sabem qual é a minha verdadeira situação. Tudo se complicou a partir do momento em que eu tive a ousadia de publicar as contas do presidente José Eduardo dos Santos e de apresentar uma queixa crime por peculato, devido aos milhões de dólares que foram desviados dos cofres do Estado para as contas do Presidente José Eduardo dos Santos. Ameaçaram-me com a morte, partiram-me o carro, invadiram a sede do meu partido, dispararam com dois tiros contra a sede da associação ‘Mãos Livres”, onde também trabalho como advogado, assaltaram os nossos escritórios em Benguela, foram também ao escrotório do Partido Popular no Moxico e destruiram a nossa documentação que tinha a vêr com a apresentação de assinaturas para a corrida eleitoral, prenderam o nosso secretário durante muito tempo em parte incerta e foi preciso exercer muita pressão para que ele reaparecesse, e com regularidade continuo a receber – por sms, por telephone e em vários sites na internet – ameaças diretas contra a minha pessoa.
DW África: Declarou a sua intenção de concorrer às eleições em Angola. Espera vencer as eleições deste ano?
DM: Mesmo não vencendo, acho que estou a contribuir para a democratização de Angola. Vencendo ou não estas eleições queremos emitir um sinal bem claro que a época do medo terminou. Estamos numa fase em que – em situações normais – estariamos em condições de derrubar este regime.


segunda-feira, 28 de maio de 2012

Situação em Angola exige luta por um processo eleitoral limpo - Bloco Democrático.



SECRETARIADO REGIONAL CENTRO – SUL
PARTIDO BLOCO DEMOCRÁTICO

COMUNICADO FINAL

Reunido em sessão extraordinária, pelas 10h00 do dia 26 de Maio de 2012, num dos hotéis da cidade de Benguela, os membros do Secretariado Regional Centro-Sul de Angola, integrado pelas províncias de Benguela, Huambo e Kwanza Sul, reflectiram e deliberaram sobre as seguintes matérias:


Os resultados eleitorais de 2008 levaram a que os angolanos ficassem mergulhados num clima de exclusão social forte, apesar do crescimento económico do país que mais beneficia os detentores do poder político. Esta situação exige que a luta pela verdade eleitoral num processo limpo e transparente requeira dos militantes do Bloco Democrático um envolvimento directo na denúncia de toda a prática tendente a sustentar a fraude.


Deste modo, o Bloco Democrático conclama que todos os eleitores angolanos contribuam com o seu voto consciente para a eleição de uma Assembleia Nacional justa e equilibrada, que corresponda com os seus interesses e não com os do príncipe José Eduardo dos Santos.


Sempre firmes, somos pela Liberdade, Modernidade e Cidadania.


Benguela, 26 de Maio de 2010

OS PARTICIPANTES

Bloco Democrático desmente negociações com Coligação CASA - CE.


NOTA DE ESCLARECIMENTO

Luanda -  Recentemente o semanário “O Continente”, a propósito de entrevista concedida pelo SG do BD a este jornal,  estampou em título de capa a constituição de uma Frente Única que vem sendo interpretada em muitos círculos como integração do BD na Coligação CASA - CE, desencadeando desse modo a confusão e a ideia de terem existido negociações ao arrepio do disposto nos Estatutos e fora do conhecimentos dos órgãos competentes do partido.



Sendo que o BD pauta a sua actuação em princípios de transparência e respeito pelas próprias normas, democraticamente aprovadas nos seus órgãos deliberativos, e visando repôr a verdade dos factos, esclarece:


1.     Em lado algum da entrevista foi referida a constituição de Frente Única pelo que o BD  está  a preparar o processo para concorrer às eleições de 2012 com sigla própria, sem integrar qualquer coligação.


2.     O BD tem dois planos de intervenção estratégica em termos de acordos com as forças políticas credíveis da oposição


a) Luta comum,  pela verdade eleitoral e controle do voto;

b) Acordos, pos eleitoral, de incidência parlamentar, para defesa e combate das questões de interesse nacional que mais afectam o povo angolano.


O BD apela ao envolvimento de todos os militantes, simpatizantes e amigos, na recolha de subscrições para inscrever o partido no Tribunal Constitucional, para concorrer às eleições de 2012.


Liberdade Modernidade Cidadania

Pl O Secretariado Nacional de Informação e Comunicação
Adão Ramos

sábado, 26 de maio de 2012

Milhares assinam petição a favor da Rádio Ecclesia.


Milhares de assinaturas foram já recolhidas para uma petição pedindo ao Presidente José Eduardo dos Santos para autorizar a expansão do sinal da Rádio Ecclesia, a emissora católica de Angola.

Isto numa altura em analistas e mesmo figuras da Igreja Católica rejeitam argumentos governamentais que essa autorização não pode ser dada por não haver legislação para tal, afirmando que há apenas falta de vontade política por parte das autoridades.

O jornalista e investigador Rafael Marques pensa que a decisão do governo angolano em restringir o sinal da emissora católica angolana à Luanda, não tem respaldo legal e é uma decisão política.

Marques sustenta a sua afirmação alegando que aquando da restituição dos direitos da emissora, o governo o fez com todos os seus direitos legais, incluindo a transmissão em ondas curtas, médias e em frequências moduladas.

Em declarações à imprensa a 11 de Dezembro de 2011, a propósito da sua visita às instalações da Rádio Ecclesia em Luanda, por ocasião dos 56 anos da emissora, a Ministra da Comunicação Social, Carolina Cerqueira disse que a expansão do sinal da emissora católica de Angola era uma questão legislativa, sustentando que depois da promulgação da Constituição da República há a necessidade de se adequar todo figurino legislativo referente ao sector à lei magna do país, processo esse que está em curso, segundo afirmou a ministra.

A propósito, Rafael Marques diz que os argumentos da Ministra são infundados, a julgar pelo surgimento e a expansão em algumas províncias de Angola da Rádio Mais e da Z TV, ambos do grupo Media Nova, cujos principais accionais são altas figuras do aparelho do estado.

O Surgimento e a expansão destes órgãos de informação não obedeceram a criação de uma nova lei, sustenta o Jornalista.
Por sua vez Luís Jimbo o Director Executivo do IASD, Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais pensa que haja outra questão de fundo no assunto Expansão da Rádio Ecclesia, e que nada tem a ver com questões de ordem legal.

A Rádio Ecclesia deve emitir em todo país, defende Rafael Marques, uma vez que os Bispos da CEAST estão em posse de uma licença emitida pela Direcção Nacional de Informação do Ministério da Comunicação social, emitida em 1993 e que não foi revogada.

Rafael Marques diz que a actual ministra da Comunicação social mente quando alega questões de ordem jurídico-legais como estando na base da restrição do sinal da emissora.
O problema não deve ser apreciado apenas na perspectiva de ser um assunto restrito a CEAST e o governo. Luís Jimbo Director Executivo do IASD defende mais envolvimento da sociedade nas discussões em torno do assunto e afirma que a questão de expansão da Rádio ecclesia passa a ser um problema de nação.

Para Rafael Marques a sociedade civil deve, em solidariedade, dizer aos Bispos e a Rádio para emitir nas restantes províncias do país em cumprimento das leis que ainda não foram revogados e que ao abrigo das quais a Ecclesia foi autorizada anteriormente a emitir para todo pais.

Alguns leigos católicos de algumas dioceses do país sentem-se envolvidos no problema da expansão do sinal da Rádio Ecclesia em toda Angola.

A nível nacional decorre um processo de recolha de assinaturas para uma petição, no sentido de pressionar o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, a autorizar a expansão do sinal da Rádio Ecclésia em todo território angolano. A iniciativa que já recolheu milhares de assinaturas é da Acção dos Leigos Católicos de Angola, ALCA, um movimento que criado eventualmente para este fim e que deplora o facto do problema da extensão do sinal da Ecclesia não ter sido ainda resolvido.

As cartas dirigidas ao Presidente da República, à Assembleia Nacional e de mais entidades foram enviadas em Janeiro do corrente ano. Alcides Chivango é o Porta-Voz da ALCA afirma que há muita demora na resposta.

O também Secretário Nacional do Movimento Juvenil Dominicano, da Ordem dos Pregadores acredita na boa vontade dos angolanos e sobretudo dos políticos. A ALCA segundo o leigo vai primar pressão pacífica.

Esta iniciativa dos leigos está a comover um número considerável de cidadãos católicos por toda Angola. Já são milhares os assinantes da acção da causa da ALCA. Alcides Chivango diz que isto mostra a vontade do povo em ouvir rádio da igreja angolana em todo país;

No comunicado final da primeira Conferencia anual e ordinária dos Bispos da CEAST, que teve lugar em Março do corrente, os prelados encorajaram as autoridades a darem o primeiro passo decisivo para que se ultrapasse quanto antes esta questão, evitando assim a multiplicação de especulações em torno do assunto.

Marques pensa que o projecto dos leigos deve ser mais ambicioso e exigir explicações ao Executivo.

Por seu turno, o Bispo da diocese de Cabinda e Presidente da Comissão Episcopal das Comunicações Sociais da CEAST, Dom Filomeno Viera Dias, considerou recentemente que a questão da expansão do sinal da Emissora Católica em toda extensão do território nacional é um problema de vontade política.•

Para o também Vice-presidente da CEAST, essa é uma situação que se vai ultrapassar.

O IASD tem um olhar crítico sobre esta situação a julgar pela aproximação das eleições. Luís Jimbo pensa que a se continuar nesta situação até às leis legislativas previstas para este ano, vai mostrar o nível em que está a democracia angolana. O Director do IASD reafirma que o direito a uma informação diversificada e plural é uma questão de interesse público. O surgimento e a expansão de mais órgãos de informação, pode favorecer a cobertura eleitoral.

Emissora Católica foi proibida de transmitir, por um período  de tempo, e os seus bens confiscados, a pretexto da tentativa de golpe de Estado de Maio de 1977. Após levantamento da proibição, o seu sinal foi restringido a  Luanda na década noventa.

Fonte:VOA

"O MPLA sempre tratou os dissidentes da pior forma" - 27 de maio de 1977 em Angola - 2ª parte da entrevista com Dalila Mateus


Vamos tentar perceber os contornos internos e externos da perseguição violenta dos chamados "fraccionistas" pelo MPLA de Agostinho Neto, o primeiro presidente de Angola, durante a qual morreram milhares de pessoas.

A historiadora portuguesa Dalila Mateus publicou com o seu marido Álvaro Mateus o livro “Purga em Angola” sobre este episódio da história angolana. Nesta segunda parte da entrevista à DW, ela fala sobre os contornos dos acontecimentos.

Um papel importante no 27 de maio de 1977 tiveram os soldados cubanos, que lutaram ao lado do MPLA de Agostinho Neto (na foto: início da retirada dos cubanos de Angola em 1989).

De acordo com Dalila Mateus, muito da história de Angola e sobre o 27 de maio de 1977 ainda estará por contar, porque falar destes acontecimentos tornou-se um tabu, pelo clima de medo que se instalou naquele país. Toda a documentação que tem recolhido está depositada na Torre do Tombo em Lisboa e Dalila Mateus tem esperanças que, a seu tempo, o Tribunal Penal Internacional possa debruçar-se sobre estes atos para que seja feita justiça em nome das vítimas e dos seus familiares.

DW África: Muitas vítimas eram militantes do MPLA, considerados "heróis" da luta contra os portugueses. Como se explica tanta violência dentro de um movimento de libertação?
Dalila Cabrita Mateus: O MPLA era, de facto, uma frente, agrupando gente de diferentes quadrantes políticos e sociais: comunistas pró-soviéticos, pró-chineses, pró-titistas, nacionalistas negros, terceiro-mundistas e muitos outros, que estão dentro do MPLA.
Mas Neto trata esta frente como um partido leninista, construído sobre o princípio do chamado centralismo-democrático, mas com muito centralismo e pouca democracia. Ele é presidente, é o secretário-geral e é o tesoureiro. E quem não pensa como ele é dissidente ou "fraccionista".

E estes dissidentes são tratados sempre da pior forma. A Assembleia que elege Neto para presidente, elege para vice-presidente Matias Miguéis, também negro. Matias Miguéis era adepto de Viriato da Cruz. Em 1965, foi levado para Dolisie [hoje Loubomo, uma cidade da República do Congo] e morto. A partir daqui, a partir desta data, a execução dentro do MPLA passa a ser a forma de resolver o problema das dissidências.

DW África: Muitos protagonistas do levantamento do 27 de maio eram militares da chamada 1ª Região Militar, que lutaram contra o colonialismo português? Porquê?
DM: De facto, perto da capital [Luanda], formou-se um grupo de guerrilha, cujos primeiros elementos foram participantes no 4 de Fevereiro de 1961. Praticamente não tinham ligações com o MPLA, que só uma vez, através de um destacamento comandado por Monstro Imortal [nome de guerra de Joãõ Jacob Caetano, comandante do MPLA], conseguiu chegar até eles, levando-lhes alguns alimentos e armas.
Quem são estes homens da 1ª Região Militar? Apoiavam-se nas redes clandestinas que se iam formando na cidade de Luanda. Resistiram13 anos aos ataques do exército português, da polícia política portuguesa, a PIDE, e até da FNLA [movimento de libertação concorrente]. E nunca foram aniquilados.

No Congresso de Lusaka, foi o seu representante, Nito Alves, que salvou Agostinho Neto. O qual começou por lhe "pagar" promovendo-o. Mas, depois, expulsou-o, prendeu-o e, finalmente, mandou-o matar.

Parece ter sido fuzilado. Depois, segundo as nossas informações, a sua cabeça andou decepada por Luanda, em cima duma carrinha. Finalmente, segundo dizem, terão atirado o corpo ao mar.

DW África: Muitos dos angolanos que estudaram na União Soviética foram chamados de volta e executados. Porquê tanto medo dos que tinham ligações com a União Soviética?
DM: Não só da União Soviética, mas de todos os países de Leste e mesmo de Cuba. E o problema não era o medo dos comunistas. Eram simples bolseiros que se formavam nas universidades. Na esmagadora maioria não eram comunistas, nem se interessavam pela política. O problema era outro.

Nas explicações oficiais sobre o 27 de Maio, uma das versões era que se tratava de um golpe dos comunistas, apoiado pela União Soviética e pelo PCP [Partido Comunista Português].
Essa versão destinava-se a facilitar o "namoro" aos Estados Unidos da América, que na altura apoiavam a FNLA e a UNITA [os dois movimentos angolanos de libertação concorrentes ao MPLA].

Ora como não havia comunistas suficientes para justificar esta atuação, então inventaram-nos. Mandaram, então, regressar os bolseiros nos países de Leste, que pensavam ir para o Congresso do MPLA. Estes homens são convencidos que vão a Luanda para participar no Congresso do MPLA. Mas, ao desembarcarem, foram presos. E, segundo um antigo dirigente do MPLA que eu entrevistei, acabaram por ser degolados.

Da matança, só escapou o filho de Neto e um amigo que estudavam na Roménia.

DW África: José Eduardo dos Santos estudou na União Soviética, em Baku, licenciou-se em Engenharia de Petróleos. Mesmo assim escapou à repressão. Como explica isso?

José Eduardo dos Santos matinha relações estreitas com o bloco soviético (aqui com Erich Honecker, secretário-geral do partido comunista da RDA - República Democrática da Alemanha)
DM: Quanto a Eduardo dos Santos, dirigente do MPLA, também esteve para ser preso. Mas não por ter estudado na União Soviética. Mas sim, pensamos nós, que correu este risco pelo facto de, sendo presidente de uma comissão de inquérito ao fraccionismo, ter assinado um relatório em que ele próprio que negava a existência desse fraccionismo.
Pelo menos, na Cadeia de S. Paulo, um dos carrascos dizia muitas vezes que, para quem queria ouvir, só faltava prender Lopo de Nascimento (o primeiro-ministro) e o Eduardo dos Santos. Que só não foi preso, porque o governador do Lubango, onde se encontrava, não o deixou prender.
DW África: Qual era o modelo do "Poder Popular" que Nito Alves defendia?
DM: No nosso livro dizemos que Nito Alves padecia das limitações de quem vivera muitos anos isolado e acossado. Se pensamos como viveu esta gente na 1ª Região, eles estavam sistematicamente a ser acossados pelo exército português, pela PIDE e pela FNLA.
Portanto, Nito Alves encontra um manual marxista e transforma este manual numa espécie duma nova Bíblia, onde ele encontra soluções para todos os problemas.
Mas estas limitações vão levar a estas manifestações, que por vezes podem parecer – ou são – de radicalismo e de dogmatismo. As suas "Treze Teses" são de facto um texto insuportável, com dezenas de citações a propósito e, sobretudo, a despropósito.
No entanto, quem aparecia a defender soluções radicais eram Neto e alguns dos seus homens, que, de vez em quando, falavam da "revolução proletária".
Não ouvimos isto de Nito Alves. Ele e os elementos mais esclarecidos do seu grupo retorquiam que era um disparate, pois em Angola não existia uma classe operária capaz de realizar tal revolução. E preferiam falar de uma democracia popular.
DW África: Era um modelo democrático ou comunista, inspirado na União Soviética?

Dalila Cabrita Mateus - historiadora portuguesa
DM: O modelo soviético não tinha qualquer sentido em Angola, até porque a maioria dos operários e técnicos qualificados eram portugueses. E é um erro pensar que eram ideológicos os problemas que preocupavam Neto e os seus próximos.
O que os preocupava era, em primeiro lugar, a denuncia que os nitistas faziam da corrupção, que estava a acontecer. E davam exemplos concretos dessa corrupção.
Preocupava-os, em segundo lugar, a influência dos nitistas nas organizações populares eleitas nos musseques [os bairros pobres de Luanda]. Eram eleitas as organizações populares e essas organizações tinham um papel fundamental.
E preocupava-os, em terceiro lugar e principalmente, a possibilidade real de os "nitistas" virem a conquistar a maioria dos delegados no próximo Congresso [do MPLA].
DW África: Além de fraccionismo, Nito Alves foi também acusado de racismo. Com razão?
DM: De facto, Nito Alves foi acusado de racismo por ter afirmado que "no dia em que, em Angola os cidadãos varredores de ruas forem não só negros, mas mestiços e brancos também, o racismo desaparecerá". Aí estava o "racismo das lagartixas", acusava o Jornal de Angola.
Só que a citação estava incompleta. Nito Alves dissera também que o racismo teria desaparecido no dia em que "os camaradas angolanos de origem europeia" puderem ascender "aos mais altos órgãos do MPLA e às responsabilidades administrativas e outras no aparelho de Estado".
Admitir que brancos e mestiços, considerados "angolanos de facto e de direito", pudessem ocupar cargos de topo no MPLA ou no Estado não é uma posição racista.
DW África: Algumas vítimas do 27 de maio tinham tido ligações estreitas ao Partido Comunista Português (PCP), que, por sua vez, era um aliado do MPLA na luta anticolonial. Que papel teve o PCP nos acontecimentos?
DM: A única pessoa que foi directamente acusada pelo MPLA de ser do PCP era Sita Valles, que fora dirigente da UEC – União dos Estudantes Comunistas. Mas Sita Valles já não era membro do PCP.

Um mês depois do 27 de Maio, Sérgio Vilarigues, membro do Secretariado e da Comissão Política do PCP vai a Luanda e dá uma entrevista ao oficioso Jornal de Angola. Em setembro, a editora comunista publica a versão dos dirigentes do MPLA sobre os acontecimentos. E nesse mesmo mês de setembro, o vice-director da DISA, ainda hoje conhecido em Angola pelo "assassino", encabeça uma delegação do MPLA presente na Festa do jornal comunista Avante!
Assim, se houve participação do PCP foi ao lado do Presidente de Angola [Agostinho Neto] e dos "vencedores" do 27 de Maio.

DW África: Como se explica o facto de, fora de Angola, poucos conhecerem a repressão do 27 de maio quando, ao mesmo tempo, todo o mundo conhece as atrocidades cometidas pelo ditador chileno Augusto Pinochet, mais ou menos na mesma época, mas que "apenas" causaram a morte de aproximadamente 3.000 pessoas?
DM: Difícil seria que fosse doutro modo.
Primeiro porque, mesmo em Portugal, o caso foi silenciado. Na imprensa portuguesa era surpreendente a ausência duma posição activa de denúncia das violações flagrantes dos mais elementares direitos do homem.

Segundo, porque em regra e em relação à África, só quando as barbaridades atingem enormes proporções é que elas são notícia.

Terceiro, porque a diplomacia dos interesses continua a ter muita força.
DW África: Será preciso uma Comissão da Verdade do 27 de maio de 1977 para chegar a uma verdadeira reconciliação em Angola?

Agostinho Neto - o "vencedor" do 27 de maio de 1977
DM: Tenho muitas dúvidas que assim possa acontecer 35 anos depois dos acontecimentos, quando muitos dos principais actores já faleceram ou abandonaram a vida política, uma tal comissão não me parece ser possível, nem importante.

Nesta altura, afigura-se mais sensata e oportuna uma acção que envolva dois aspectos:
Primeiro: o esclarecimento e o assumir de responsabilidades pelo próprio MPLA.
Segundo e principalmente: que se faça uma busca e a entrega das ossadas dos mortos para que as famílias possam fazer o luto da sua dor.

Ainda hoje tenho pesadelos com este horror" - 27 de maio de 1977 em Angola - 1ª parte da entrevista com Dalila Mateus.


Há 35 anos, no dia 27 de maio de 1977, começou um dos períodos mais negros de Angola. Neste dia houve manifestações em Luanda a favor de Nito Alves. A seguir, milhares de angolanos são torturados e assassinados.

No dia 27 de maio de 1977 populares manifestaram-se em Luanda a favor de Nito Alves, na altura ministro da Administração Interna e membro do Comité Central do partido no governo MPLA. As manifestações das massas foram na altura classificadas pelo Presidente de Angola, Agostinho Neto, como uma tentativa de golpe de estado.

Nos dias e meses a seguir ao 27 de maio de 1977, os apoiantes de Nito Alves, o chamados "fraccionistas", são expulsos do MPLA. Dezenas de milhares são torturados e assassinados sem julgamento.

Falamos com a historiadora portuguesa Dalila Cabrita Mateus sobre este episódio da história angolana. Ela publicou com o seu marido Álvaro Mateus o livro “Purga em Angola”, lançado em 2007 (agora na sexta edição). Neste Contraste apresentamos a primeira parte da entrevista da pesquisadora à DW.

DW África: Qual foi o episódio que mais a marcou durante as pesquisas sobre os acontecimentos de maio de 1977?
Dalila Cabrita Mateus: As entrevistas a antigos presos políticos barbaramente torturados marcaram-me particularmente. Para a minha tese de doutoramento, já tinha ouvido presos angolanos, moçambicanos e guineenses, que me contaram as torturas infligidas pela PIDE. Depois, para o livro sobre o 27 de maio, ouvi presos angolanos narrar o que sofreram nas cadeias. Ainda hoje sonho, tenho pesadelos, com este horror.

Um dos últimos presos que ouvi, depois de narrar o que lhe tinham feito, encostou-se a uma porta e da sua boca saiu um suspiro enorme. Tinha desabafado. Disse-lhe: "O senhor conseguiu, enfim, desabafar." Mas eu, que ando há anos a ouvir o sofrimento de todos os presos políticos, com quem desabafo?

A gravação e a transcrição de todas estas entrevistas estão hoje depositadas na Torre do Tombo.

DW África: Consegue resumir num minuto o que aconteceu de facto no 27 de maio de 1977?

Dalila Cabrita Mateus - historiadora portuguesa

DM: Alguns pequenos grupos armados tomaram cadeias, com o propósito de libertar gente sua que estava presa. Por exemplo o Batalhão Feminino tomou a cadeia de São Paulo. Estavam presos dezenas de elementos do grupo de Nito Alves e José Van Dunem. Eles próprios, como se comprova pela gravação escutada das emissões da rádio em Angola e por alguns testemunhos, estavam detidos.

Um pequeno grupo tomou a Rádio, com o objectivo de apelar a uma manifestação em frente ao Palácio. Dos musseques [os bairros pobres de Luanda] afluíram centenas e centenas de manifestantes, que começaram por se dirigir ao Palácio. Tendo sido recebidos a tiro, começaram a concentrar-se em frente à Rádio.

Não há, pois, qualquer golpe de Estado. O que há é uma manifestação e algumas acções militares para libertar presos e tomar a rádio. "Insurreição desarmada de massas", lhe chamou o historiador inglês David Birmingham.

O objectivo era provocar uma alteração radical da política, seguida de uma insurreição. Mas o meio era uma simples manifestação, e isso prova-se hoje através das imagens, na altura obtidas pela própria Televisão Popular de Angola.

DW África: Tomaram a Cadeia de São Paulo, a sede da polícia política DISA e a Rádio Nacional, mas não o Palácio Presidencial. Porquê uma estratégia tão mal concebida?
DM: Tomaram de facto a Cadeia de S. Paulo, mas nunca tomaram a sede da DISA. E não queriam tomar o Palácio Presidencial. "Plano louco e mal concebido", diz o historiador inglês Birmingham.

Mas não queriam realizar de facto um golpe de Estado. Confiavam na superioridade de forças que tinham, entre os militares da 9ª Brigada e na população. E nunca terão imaginado que os cubanos fossem intervir com tanques para dispersar a manifestação e tomar o quartel da 9ª Brigada.

DW África: O levantamento dos apoiantes de Nito Alves e José Van Dúnem pode ser considerado um golpe de Estado?
DM: Num golpe de Estado ou numa insurreição, toda a gente o sabe que se tomam locais, com militares e civis armados; tomam-se a Presidência e os ministérios, a polícia política, os correios e as telecomunicações, os quartéis, o aeroporto, entre outros.

Se não havia um plano para tomar nada disso e a grande acção é uma manifestação de gente desarmada, como é que se pode falar dum golpe de Estado?

DW África: Qual foi o papel dos soldados cubanos na repressão do "golpe"?
DM: Os cubanos foram mandados intervir por Fidel Castro, depois de este ter falado com Agostinho Neto. Fortemente armados e utilizando tanques, acompanharam a polícia política DISA e ocuparam a rádio, dispersaram os manifestantes e, depois, tomaram o quartel da 9ª Brigada. Quem o declara é o general cubano Rafael Moracen. Depois, os cubanos ainda colaboraram nos interrogatórios de presos.

DW África: O que aconteceu com os detidos do movimento do 27 de maio?
DM: Os participantes no 27 de Maio foram presos e torturados. Muitos foram sumariamente fuzilados, sem qualquer tipo de julgamento. Outros foram mandados para campos de concentração e ali morreram. Os que podem ser considerados os mais felizes, são aqueles que acabam ser libertados ao fim de dois anos de tantas torturas e de terem passado tão mal.

Mas nem só os participantes foram presos. Foi também detida muita gente que pouco tinha a ver com os acontecimentos. Uns, porque possuíam bens que eram cobiçados. Outros, porque eram amigos ou familiares dos chamados "fraccionistas". Ainda outros, porque tinham criticado ou manifestado o seu descontentamento com a forma como as coisas corriam. Outros porque tinham tido azar e estavam na rua. Finalmente outros porque eram intelectuais ou estudantes, grupos sociais particularmente visados.

DW África: Qual foi o destino de Nito Alves e José Van Dúnem?
DM: Foram presos e sumariamente fuzilados, sem que tivessem sido acusados e julgados.
DW África: Como funcionava a Comissão das Lágrimas?

DM: A Comissão, a que o povo chamou das Lágrimas, foi criada pela Direcção do MPLA, com o objectivo de selecionar depoimentos sobretudo de intelectuais presos no 27 de Maio. E por isso era constituída por elementos considerados "intelectuais". Essa Comissão interrogava, provocava e decidia se o preso devia ou não ser entregue aos militares e às polícias; isto é, se ia ou não para a tortura.

DW África: Qual foi o papel dos escritores angolanos Pepetela e Luandino Vieira nessa Comissão das Lágrimas?
DM: De facto, na Comissão estiveram Pepetela e Luandino Vieira, mas também Manuel Rui Monteiro, Henrique Abranches, Costa Andrade e muitos outros. Aos presos que ouvimos e que passaram por aquela Comissão ouvimos referências às perguntas provocatórias de Pepetela e de Costa Andrade.

DW África: Até que ponto foi usada a tortura?
DM: Todos os presos, sem excepção, foram barbaramente torturados. Não foram só os presos que ouvimos que se referiram às torturas. A própria Amnistia Internacional, num documento de Dezembro de 1981 sobre os acontecimentos, faz alusão às muitas torturas usadas.

Espancamentos com martelos e barras de ferro, chicotadas, queimaduras com cigarros, choques eléctricos execuções simuladas, e ainda algumas originalidades tradicionais, tudo isso foi usado para torturar os presos.

Guerrilheiros na luta anti-colonial em setembro de 1969 (fotografia de arquivo da União Soviética) - muitas vítimas do 27 de maio eram antigos combatentes da luta contra o colonialismo português

DW África: Quantas pessoas perderam a vida no total?
DM: Há cálculos diversos. A Fundação 27 de Maio, formada por antigos presos de 27 de Maio, fala de 80.000 mortos. O jornal Folha 8 de 60.000. Adolfo Maria, militante da chamada "Revolta Activa" e o juiz angolano José Neves, que participou numa Comissão de Inquérito aos acontecimentos, apontam para 30.000 mortes.
A Amnistia Internacional avançou com uma estimativa que vai de 20.000 a 40.000. Um elemento da polícia política DISA, entrevistado por mim, dizia terem sido apenas 15.000 mortos. Eu e meu marido, no livro que escrevemos, ficamos pelo número mais vezes referido. Seriam, pois, uns 30.000.

DW África: Quem eram os responsáveis pela violência?
DM: Autores materiais houve muitos, entre militares e elementos da DISA, a polícia política. Mas a própria DISA era dirigida por uma Comissão Nacional de Segurança, cujos responsáveis máximos eram Agostinho Neto, Lúcio Lara, Iko Carreira, Rodrigues João Lopes (Ludy) e Henrique Santos (Onambwé).

Os mandantes são, pois, facilmente identificáveis. Além de Agostinho Neto (ele mesmo ou através do seu chefe de gabinete), Iko Carreira, Lúcio Lara, João Luís Neto (Xietu) e Henrique Santos (Onambwé). Mas também tiveram os seus conselheiros, designadamente alguns embaixadores que não tiveram tento com a língua.

Nelson Mandela em 1952 - o seu movimento, o ANC, tinha muitas fracções, lembra Dalila Mateus

DW África: Então está a dizer que o principal responsável é o primeiro presidente da República de Angola, Agostinho Neto?
DM: É evidente. Nós afirmamos que as principais responsabilidades recaem por inteiro sobre Agostinho Neto, o presidente de Angola.

Aqui cabe a lembrar o que pensaria ou faria Nelson Mandela, se estivesse na mesma situação. Referindo-se à governação de Creonte, na Antígona de Sófocles, sua peça preferida, Nelson Mandela dizia que "não se pode julgar um homem completamente, o seu carácter, os seus princípios, o seu sentido de justiça, até ter mostrado o que vale no governo do seu povo".

Ora, Neto não se preocupou com o apuramento da verdade. É este o grande problema. Dispensou os tribunais, declarando publicamente que não iria perder tempo com julgamentos. Está na televisão, qualquer pessoa pode ver isto. Admitiu que fizessem justiça sumária pelas próprias mãos.

Ora, se compararmos de novo com Nelson Mandela: o ANC [African National Congress, o movimento de libertação da África do Sul] tinha 36 grupos e fracções. Mandela queria que vissem uma grande tenda que podia acolher muitos e variados pontos de vista. E sabia que não se podiam cortar os laços com a juventude, por muito excessiva e simplista que fosse, pois não se constrói o futuro sem aqueles que o irão viver.

Imaginemos, então, por momentos, que, em vez de Mandela, a África do Sul teria tido por presidente Agostinho Neto. Em que banho de sangue não se teria mergulhado?