sábado, 12 de novembro de 2011

DISCURSO DE ENCERRAMENTO DA CONFERÊNCIA NACIONAL DO BLOCO DEMOCRÁTICO 23 DE OUTUBRO DE 2011 NO CEFOCA

Minhas Senhoras e meus Senhores!
Caros Companheiros do Bloco Democrático!
Respeitáveis Convidados a este evento!


A situação nacional exige de todos nós uma séria reflexão, para, assim, sermos capazes de intervir e contribuir para a definição de um rumo melhor para o país.
Todos os dias vemo-nos confrontados com novos e cada vez mais difíceis desafios, uns fruto da conjuntura meramente interna, e outros como resultado da situação internacional.
Internamente, é visível o modo como se pretende obstruir todos os canais por onde deve circular a “seiva” da democracia:
 i.      Acentua-se a mordaça sobre os órgãos de comunicação social do Estado, transformando-os em meros instrumentos de desinformação e de propaganda do partido no poder.
ii.      Já se controlam praticamente os principais órgãos de comunicação social alternativos, pela sua aquisição por grupos económicos umbilicalmente ligados ao poder. Porém, a estratégia de asfixiamento iniciou com o esvaziamento das fontes de financiamento, retirando-lhes, paulatinamente, a publicidade. Tornou-se, assim, mais fácil, o assalto final.
iii.      Sob a aparência de uma maior abertura ao sector privado, tem-se acelerado o processo de desenvolvimento de novos grupos empresariais nas várias componentes da área da comunicação social, tais como rádio, jornais, televisão, revistas, numa clara estratégia para o controlo total do espaço mediático, colocando, inclusive, sob sua dependência os jornalistas mais destacadas do sector. Está, assim, pois, gravemente ferido um dos meios essenciais para o exercício de uma informação plural e livre. Apesar de consagrado na lei, o direito de antena não é respeitado.
iv.      Multiplica-se a criação de organizações da sociedade civil de inspiração governamental, (disfarçadamente do partido no poder), para quem se afectam discricionariamente volumosos recursos que lhes permitem depois surgir com a imagem de “benfeitores”, indo em socorro dos segmentos mais frágeis e débeis da nossa sociedade. Porém, ficam à margem dos apoios públicos organizações da sociedade civil descomprometidas, muitas delas pioneiras no associativismo nacional
v.      Erguem-se múltiplos obstáculos à acção das formações partidárias da oposição, estigmatizando-as como se de grupos subversivos e antipatrióticos se tratassem.
vi.      Concentra-se a riqueza nacional nas mãos dos fiéis ao regime, tornando-os assim sustentáculos do regime.
vii.       Assiste-se a uma clara instrumentalização das instituições do Estado, ao nível da Administração, da Justiça, dos órgãos de Defesa e de Segurança.
Tudo isto potencia a conflitualidade social que é bem presente e visível; uma conflitualidade ainda estimulada por muitas outras carências de que a nossa sociedade enferma: a persistência de elevados níveis de desemprego, a precariedade da saúde e do trabalho, o aumento da carestia de vida, as dificuldades no acesso à água potável, aos bens essenciais, as enormes e crescentes desigualdades sociais.

O mau estado da saúde tem gerado grande mal-estar entre os cidadãos. São enormes os índices de mortalidade infantil e materno-infantil, se comparados até com países do nosso continente e com menos recursos do que nós. Morre-se muito, fruto de endemias que deveriam estar controladas e dominadas.
A educação também enferma de males sem cura imediata, mesmo que se esteja a criar a ilusão de que estamos a crescer nessa área.
Temos que tomar consciência de que com o tipo de educação que hoje possuímos, nunca seremos competitivos, porque ainda não estamos a formar os quadros de que necessitamos, quer quantitativa, quer qualitativamente.
O saneamento básico, a energia eléctrica, a flagrante carência de água, a desordem no domínio da habitação, a insegurança nos bairros, são motivo bastante para o desespero das populações.
Não é possível, também, negar nem disfarçar a repressão policial e judicial aos movimentos sociais. Fica, assim, desmascarada a verdadeira cultura política hoje prevalecente: a criminalização da pobreza.
Em Angola, o Estado de Direito Democrático é, pois, ilusório. Uma ilusão que se acentua com o processo de concentração do poder nas mãos de um só homem, a quem verdadeiramente se subordinam os diversos poderes.
Minhas Senhoras e meus Senhores!
Quem tem dúvidas sobre o esquema tentacular de corrupção que foi intencionalmente montado e instituído? Quem não vê quem são os seus principais beneficiários? Quem também não percebe a identidade das suas vítimas?
À vista desarmada, percebe-se o processo de enriquecimento ilícito e a falácia da aplicação da Lei da Probidade Pública. Este instrumento jurídico, apressadamente elaborado e aprovado, tem-se mostrado, de facto, um embuste. Afinal, não passa de um engenhoso artifício para lançar poeira aos olhos dos incautos, dos menos prevenidos, pois só atinge quem caia em desgraça perante os principais detentores do poder.
Minhas Senhoras e meus Senhores!
Ilustres Convidados!
Caros Companheiros!
A nossa Juventude tem manifestado de um modo vigoroso o seu desencanto pelo actual estado de coisas. Ela tem sido obrigada a exprimir o seu sentimento nas ruas, num crescendo de manifestações públicas. Alguns desses jovens começam mesmo a conhecer a condição de presos políticos, uma figura que deveria ser banida num país que assumiu publicamente o desígnio de construir uma democracia.
Se antes era visível o receio de falar e exprimir livremente ideias, hoje já se recorre às cadeias para silenciar protestos legítimos.
Ninguém tem já dúvidas sobre os rumos que o nosso país está seguir. A continuar assim, poderão mesmo emergir situações menos agradáveis e mais gravosas. É isso o que o Bloco Democrático constata. É isso também o que o Bloco Democrático, com a sua acção, quer prevenir.
Que fique bem claro, nós somos aliados naturais e incondicionais daqueles que se tornaram nas principais vítimas da actual má governação.
Mas que também não haja dúvidas: Nós não somos adeptos da “arruaça”, somos, sim, respeitadores do direito à manifestação, consagrado na Lei Fundamental.
O Bloco Democrático não é como os que se abespinham quando a oposição ou a sociedade civil recorrem ao seu direito legítimo de se manifestar. Esses, os que ficam inquietos com as manifestações dos outros, e, de imediato, convocam contra-manifestações com intenções provocatórias são, na realidade, máscaras da democracia. Por isso, provocam a dita “arruaça” e programam-na com a intenção de desacreditar aqueles que são os principais agentes da mudança.
Quero, pois, particularmente, exprimir a minha admiração e gratidão à nova geração de jovens angolanos que, de um modo corajoso, saem à rua para dizer publicamente aquilo que lhes vai na alma. Eles mostram-se já os continuadores das anteriores gerações de jovens angolanos que tomarem em mãos a responsabilidade de protagonizar o processo de libertação nacional e a defesa da integridade da pátria.
De modo algum partilhamos a opinião de que a actual conflitualidade se resolve apenas com o recurso a um dito diálogo, um diálogo espartilhado e governamentalizado, tal como recentemente decidiu o Presidente da República, no seu discurso sobre “O estado da Nação”.
É bom que se saiba que nós não queremos ser uma fotocópia disfarçada da Coreia do Norte, nem da Síria. Nós batemo-nos, sim, pela democracia, e não por uma “democratura”. Ou seja, um regime político com aparência democrática em alguns domínios, mas com uma essência e práticas típicas das ditaduras.
As reivindicações que hoje se fazem são essencialmente políticas e têm a ver com o desenvolvimento da democracia. A democracia tem regras e princípios essenciais, que não se confundem com a leitura que está agora a ser feita, por questões de “ilusionismo político”.
Os jovens que hoje corajosamente se manifestam nas ruas exprimem também o sentimento dos outros segmentos sociais. Eles concentram em si as frustrações dos adultos, das mulheres marginalizadas, dos desmobilizados esquecidos, dos desvalidos, daqueles que não encontram emprego por causa das políticas económicas erradas, enfim, e afinal, as vítimas de todos os tipos de discriminação e exclusão.
Os jovens que corajosamente se manifestam nas ruas são porta-bandeira dos esquecidos, dos que são maltratados, física, económica, política e socialmente. Por isso, merecem o nosso apoio e o nosso carinho. Eles falam por nós, mesmo que, por vezes, eventualmente não usem as melhores expressões.
Com o tempo e com uma prática reiterada de protesto público, todos nós aprenderemos a usar devidamente esse e outros instrumentos de contestação democrática. O que é agora importante é que eles são porta-vozes da mudança.
Queremos uma nova política alicerçada na democracia participativa e no Estado Social de Direito.
Para nós a mudança será fruto da denúncia e da tomada de consciência dos nossos direitos.
Temos, sim, a rua para manifestarmos os nossos sentimentos, porque os restantes canais estão obstruídos ou limitados. Mas vamos ter a oportunidade de usar as urnas como o instrumento privilegiado para a alteração deste estado de coisas.
Nós somos um partido que luta por valores democráticos. Somos amantes da Liberdade, da Modernidade e da Cidadania. Queremos que o Estado esteja ao serviço da Sociedade. Não nos basta a independência política formal, somos por uma verdadeira libertação social.
Minhas Senhoras e meus Senhores!
Prezados Convidados!
Caros Companheiros!
Vem aí o processo eleitoral. Estamos a partir numa condição de inferioridade, mas temos de ter a coragem de tudo fazer para alterar, para mudar.
Um dos nossos instrumentos de luta para a mudança passa pela necessidade de haver verdade eleitoral. Isso exige vigilância, perseverança, inteligência, coragem. Temos que nos socorrer de todos os meios democráticos ao nosso dispor.
Nós, o Bloco Democrático, não somos um conjunto de aventureiros. Estamos na política para servir os cidadãos.
Temos, por isso, linhas programáticas claras, que passo a resumir:
·        Participar na edificação de um Estado Social de Direito alicerçado num Estado unitário com equilíbrios regionais, incluindo a autonomia e a prevalência do poder civil sobre o poder militar.
·        A separação efectiva dos poderes, pondo termo à actual situação de subordinação de poderes, inclusive, alguns até de legitimidade directa.
·        O regresso à eleição presidencial directa dos cidadãos, ao semi-presidencialismo e à cooperação estreita entre a sociedade civil e os órgãos do poder de Estado na base da democracia participativa.

·        Um maior equilíbrio entre os centros de poder, deixando para trás a actual concentração do poder nas mãos de um único homem.

·        Pugnar pelo respeito dos direitos fundamentais dos cidadãos, também pelas especificidades regionais, a correcção dos desequilíbrios na distribuição da riqueza e dos rendimentos.

·        A criação de oportunidades ligadas a medidas activas de não discriminação apontadas para o combate à pobreza e pelo desenvolvimento do sector agro-pecuário envolvendo as comunidades rurais, a agricultura familiar, devido ao seu papel fundamental no combate à fome e na garantia da segurança alimentar em todo o país.
·        Realizar plenamente o Estado Social de Direito, através da Família, Escola, Empresa e da Comunidade.

·        Implementar processos cada vez mais transparentes na Administração Pública, na Economia e na Justiça, é uma das nossas bandeiras, para que sejamos credíveis quer a nível interno, quer a nível internacional.

·        Lutar para a implementação de políticas capazes de gerar um crescimento virtuoso da nossa economia e que sejam geradoras de emprego, como forma de aumentarmos o nosso potencial interno e de dar satisfação a uma das necessidades mais prementes da nossa população, especialmente os mais jovens, promovendo uma política progressiva de bons salários.

·        Combater seriamente a corrupção, eliminando os factores que a geram. Na nossa perspectiva, no combate à corrupção de baixa intensidade devem ser privilegiados os instrumentos de dissuasão como, por exemplo, as regras administrativas; no combate à corrupção de alta intensidade dever-se-ão conjugar os mecanismos de transparência governativa com a investigação e a acção judicial.

·        Reverter o actual estado de dependência dos recursos provenientes do petróleo e dos diamantes, investindo seriamente nos sectores de actividades, manufactureira, no comércio, nos transportes e nos serviços, dando especial destaque para a agricultura familiar.

Minhas Senhoras e meus Senhores!
O Sector Social é de primordial importância para o Bloco Democrático, pelo seu carácter altamente reprodutivo e pelo impacto que tem no bem-estar das populações.
Para o efeito, atribuímos uma elevada cotação à Educação, à Agricultura e à Saúde para quem preconizamos a implementação de acções integradas com grande incidência na medicina preventiva a par da curativa. Neste campo, somos pela constituição de parcerias público-privadas na gestão destes sectores para um melhor aproveitamento dos recursos, conseguindo-se, assim, uma mais rápida e mais eficaz elevação da qualidade da educação, do fornecimento de água potável e da saúde.
Queremos, igualmente, dar uma maior dignidade aos diversos ramos do ensino, quer no ensino público, quer no privado, para que as nossas crianças, os jovens e os adultos tenham uma formação qualitativamente melhor.
Dedicaremos uma maior atenção à terceira idade, aos portadores de deficiência, às vítimas dos diversos conflitos, aos desmobilizados, organizando um sistema de segurança social universal integrado, gerido por uma Autoridade Administrativa Autónoma, integrada por representantes do Estado, das associações patronais e dos sindicatos.
Somos por uma efectiva igualdade do género, por via da participação activa de todos e a todos os níveis.
É por tudo isso que estamos aqui congregados e unidos com o grande intenção de mudar: mudar nos objectivos, mudar nos métodos de acção, mudar na cultura política, enfim, mudar para melhor. Queremos mudança para criar uma nova esperança para todo o nosso povo.
Muito Obrigado!
Justino Pinto de Andrade, Presidente do Bloco Democrático