Reunidos
no dia 9 de Maio de 2012 com o objetivo de avaliar a situação das comunidades
mais vulneráveis volvidos já cerca de um mês depois do Golpe de Estado ocorrido
a 12 de Abril e atendendo as dificuldades constatadas no estabelecimento de
soluções duráveis entre os diferentes atores nacionais e da Comunidade
Internacional envolvidos, que conduzam à retoma efetiva da legalidade
constitucional e restauração de um clima de paz, segurança e respeito dos
direitos cívicos e políticos dos cidadãos, as Organizações Não Governamentais
signatárias consideram o seguinte:
1.
O não funcionamento do aparelho do Estado e das instituições públicas em
particular, o não pagamento dos salários aos servidores do Estado, os entraves
colocados à campanha da castanha de caju, principal fonte de receita do país e
da maioria dos camponeses, a suspensão de projetos importantes apoiados pelas
instituições internacionais do desenvolvimento (BM, FMI, BAD) e a paragem quase
que completa da vida económica, está a provocar uma situação de aumento
acentuado dos níveis de pobreza e vulnerabilidade das populações do mundo rural
e dos bairros da capital;
2.
A paralisia das escolas públicas agravadas pelo Golpe de Estado assim como da
generalidade dos estabelecimentos de ensino, compromete seriamente o presente
ano letivo consubstanciado na sua provável anulação;
3.
A ocorrência do golpe de estado no início da campanha do caju e nas vésperas da
preparação do ano agrícola, compromete gravemente a segurança alimentar, a
situação sanitária e a economia das populações no mundo rural, agravados pela
fuga das populações da capital para o interior, que se traduz pela diminuição
dos bens alimentares já escassos nesta época no interior do país, pelo aumento
da pressão sobre os recursos naturais e as reservas de água nos poços e ainda
pelo risco de propagação de epidemias (cólera) já existentes nos países
vizinhos;
4.
A subida exponencial dos preços dos produtos de primeira necessidade devido à
paralisia nos circuitos económicos, aos obstáculos na circulação e no
abastecimento destes bens, à escassez do dinheiro no mercado e à consequente
tendência para a especulação própria deste tipo de situação, vem-se traduzindo
num aumento insuportável das privações das famílias mais vulneráveis e no
crescimento da revolta e da contestação da camada juvenil, ainda pouco visível
pela interdição de manifestações, o que pressupõe a existência de sementes de
violência de impactos devastadores;
5.
A ausência do poder de Estado em todo o país consequente ao Golpe de Estado,
está a favorecer a pilhagem crescente dos nossos recursos, pela maior
permeabilidade das fronteiras, pela paragem da fiscalização das nossas águas
territoriais, e está, sobretudo, a contribuir para a intensificação de negócios
ilícitos como o narcotráfico;
6.
A ocorrência de perseguições políticas, de privação dos direitos cívicos e
políticos dos guineenses, entre os quais o direito à informação, à expressão e
manifestação gera um clima de suspeição e de medo que entrava a união dos
guineenses e inviabiliza a busca de soluções efetivas aos problemas com que a
Nação se depara;
7.
O recurso a arquiteturas políticas visando protelar e contornar o retorno à
legalidade constitucional exigida pelos guineenses, a nível interno e na
diáspora, e pela comunidade internacional, levam a um prolongamento da situação
de impasse que afeta a paz, a segurança e a democracia na Guiné-Bissau;
8.
Este contexto de ferozes disputas de interesses intestinos acarreta o risco de
ver a Guiné-Bissau transformar-se num campo de batalha de influências
económicas e geoestratégicas que se sobrepõem e anulam os verdadeiros
interesses nacionais e levam a Guiné-Bissau a servir de terra de ninguém onde
outros promovem e realizam negócios interditos nos seus países.
9.
As razões invocadas para mais este golpe de Estado acabaram por se revelar sem
fundamento, pois nenhuma prova credível foi tornada pública, constatando-se que
os que estão direta e indiretamente envolvidos no Golpe de Estado são os
principais interlocutores negociais, sendo excluídos do processo as
personalidades e instâncias legitimadas pela Lei e pelas urnas em expressão da
única vontade que deveria contar e ser sagrada para todos: a vontade popular.
As
ONG guineenses signatárias alertam para a necessidade de:
1.
Garantir a restauração da ordem constitucional e reinstalação do Governo eleito
democraticamente e do Presidente da Republica interino;
2.
Assegurar a retoma do processo eleitoral presidencial interrompido, como
recomenda o Conselho de Segurança das Nações Unidas;
3.
Devolver a liberdade de expressão e manifestação das populações em condições de
segurança;
4.
Recolocar o processo de diálogo conjunto com as autoridades democraticamente
eleitas, as instituições legítimas do Estado, todas as organizações
internacionais envolvidas (CEDEAO, CPLP, UA, ONU), os partidos políticos e a
sociedade civil.
As
ONG signatárias assumem o compromisso de:
1.
Reforçar o trabalho de responsabilização das comunidades locais, para que elas
assumam um maior protagonismo na definição das suas posições, na defesa dos
seus interesses e direitos cívicos, no fortalecimento da sua capacidade
produtiva, económica e social pelos quais as ONG signatárias pugnam com
determinação;
2.
Promover debates ao nível local, envolvendo especialmente as comunidades, os
agrupamentos e associações, na perspetiva de contribuir para maior informação,
conscientização e implicação das populações, para o fortalecimento da coesão
social e para a salvaguarda da paz social e do bem comum;
3.
Reforçar a capacidade de análise crítica e de proposta das populações locais no
que concerne ao seu posicionamento face à situação atual que o país vive e seu
engajamento na procura de soluções duráveis, que pressupõe a reconquista do seu
direito legítimo e democrático de opinião e manifestação;
4.
Desenvolver ações de informação e comunicação junto aos seus parceiros e da
comunidade internacional, com particular atenção ao nível regional, fazendo
levar as preocupações, pontos de vista e propostas das populações locais;
5.
Promover um amplo debate nacional sobre a necessidade e o papel das Forças
Armadas no futuro da Guiné-Bissau em pleno gozo do estado de direito e
democrático.
Bissau,
10 de Maio de 2012
As
organizações signatárias:
AD
- Ação para o Desenvolvimento
AIFA/PALOP
– Associação de Investigação e Formação Orientada de Ação de Natureza
Participativa nos Países Africanos da Língua Oficial Portuguesa
ALTERNAG
– Associação Guineense para Estudos e Alternativas
Federação
Camponesa KAFO – Autopromoção Comunitária e Desenvolvimento Rural Durável
TINIGUENA
– Associação de Promoção do Desenvolvimento Participativo na Base e Gestão
Durável dos Recursos Naturais
RENARC
– Rede Nacional das Rádios Comunitárias
LGDH
– Liga Guineense dos Direitos Humanos
NADEL
-
RA
– Rede da Ajuda
Fonte: quintasdedebate.blogspot.com
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